terça-feira, 28 de outubro de 2008

Cobre em ouro: o sonho!

A transmutação da matéria [1], que só foi possível após o início do domínio da moderna física nuclear, sempre fascinou os químicos e alquimistas em toda a história.
Então, a pergunta que não quer se calar: é realmente possível realizar a transmutação da matéria a partir de técnicas químicas comuns? A resposta é: muito improvável! :-(
Mas pode-se dar uma "enganada" através da deposição oxi-redutiva de metais, também conhecida como galvanoplastia! Exemplos como douração (banhar de ouro um anel feito de alumínio), prateação, cromagem, zincagem e etc, são processos que ilustram a aplicação da galvanoplastia.

Nesse artigo, vou demonstrar como fazer isso em uma moeda de cobre (certifique-se que seja de cobre mesmo), ou qualquer pedaço ou peça de cobre.

O cobre é colocado em um frasco resistente ao calor, e aquecido em uma solução. Primeiramente, o metal é recoberto com uma camada prateada. A peça é retirada da mistura, seca e bem aquecida, quando de repente... a camada torna-se dourada e brilhante, semelhante ao ouro!

Produzimos ouro? Claro que não, mas é uma experiência muito interessante!

Detalhes experimentais

Segurança: faça a experiência em um local aberto e ventilado. Use luvas, óculos de proteção e roupas apropriadas. Não descarte a solução de zinco-NaOH diretamente no sistema de esgoto. Antes disso, neutralize a solução com ácido sulfúrico diluído (1 mol/L).

1. Colocar cerca de 5g de zinco em pó em um frasco de vidro resistente ao calor. Ao invés do zinco em pó, pode ser utilizado um pedaço maior de zinco, como o ânodo de zinco de uma pilha galvânica comum, mas a reação é mais lenta.

2. Recubrir o zinco com solução diluída de hidróxido de sódio (12g NaOH adicionados lentamente em 50ml de H2O).*

3. Esquentar o frasco cuidadosamente até que a solução quase entre em ebulição. (Cuidado especial nessa operação, essa solução é extremamente corrosiva.)




4. Limpar a peça de cobre com uma palha de aço. Lavar com água destilada.
5. Usando pinças, mergulhar a peça de cobre na solução cáustica aquecida.

6. Deixar a peça de cobre no frasco por 3-4 minutos. O cobre ficará recoberto com uma camada prateada bem definida e homogênea.

7. Retirar a peça de cobre zincada utilizando uma pinça, molhar com água, e secá-la cuidadosamente com papel toalha. Não esfreguar! Retirar cuidadosamente qualquer sobra ou partícula de zinco inapropriadamente aderida na peça.

8. Utilizando uma pinça novamente, colocar a peça zincada em uma superfície quente. A peça deve tornar-se dourada e brilhante imediatamente!
9. Quando a "cor de ouro" se formar, remover a peça de cobre da fonte de calor, lavar com água e secar novamente com um papel toalha.

A química envolvida

1. O zinco dissolve na solução de hidróxido de sódio, formando o zincato de sódio e hidrogênio:
Zn(s) + 2NaOH(aq) + 2H2O(l) Na2Zn(OH)4(aq) + H2(g)

O monóxido e o hidróxido de zinco (presentes na superfície do metal pela ação do ar e da humidade do ar) também reagem em meio alcalino, produzindo o dióxido. O dióxido consequentemente complexa em zincato, como descrito acima:
ZnO(s) + 2OH(aq) ZnO22-(aq) + H2O(l)
Zn(OH)2(s) + 2OH(aq) ZnO22-(aq) + 2H2O(l)
Quando então o cobre é colocado na solução, o zinco adere em sua superfície, tornando-o prateado. (Você pode checar isso demonstrando como essa camada de zinco dissolve-se em uma solução ácida diluída).
Essa reação envolve o conceito de célula eletroquímica; Os elétrons fluem do cobre ao zinco, e que não ocorre a menos que eles estejam em contato: ou diretamente, ou por um fio condutor.
No eletrodo de zinco:
Zn(s) Zn2+(aq) + 2e

seguindo pela complexação dos íons de zinco: Zn(OH)42–(aq)

No eletrodo de cobre:
Zn(OH)42-(aq) + 2e- Zn(s) + 4OH-(aq)
Um processo similar de zincagem é usado na indústria mas os íons cianeto, ao invés do íon hidróxido, que é usado como agente complexante.
2. Quando a peça zincada é aquecida, o zinco e o cobre sofrem uma difusão interna, para formar uma liga de latão superficial, possuindo uma colocação muito parecida com a do ouro.

Notas *
1. A reação entre o zinco e a base ocorrerá com a liberação de hidrogênio, um gás extremamente inflamável, principalmente se confinado. Pode tornar-se explosivo em concentrações de 4 a 95% no ar, então jamais realizar essa experiência em local fechado.2. O experimento é feito melhor com cobre, outros metais como aço não funcionam muito bem.3. Latão é o nome dado a liga entre cobre e zinco: zinco e cobre possuem um tamanho similar, e conseguem dissolver-se um no outro em qualquer proporção para produzir uma vasta gama de latões. A cor depende da composição: latão com concentração maior de cobre são mais douradas, e com concentração maior de zinco, são mais prateadas.

2. Um chama (e.g. bico de bunsen) pode ser utilizada na última etapa da experiência, mas deve-se tomar cuidado para não super-aquecer a peça. Se uma chapa de aquecimento não estiver disponível, uma alternativa pode ser aquecer um bloco de metal diretamente no fogo, para que daí sim este ser utilizado na experiência.

3. Se o aquecimento na etapa final for continuado, a cor dourada desaparece em troca da coloração natural do cobre, isso porque o zinco difunde-se gradativamente da superfície para o interior da peça de cobre.
4. Caso o último processo (aquecimento) seja negligenciado, a peça de cobre zincada formará uma liga com o cobre no passar de alguns meses. Isso mostra perfeitamente como os "sólidos" não são tão estáticos quanto imaginamos.


Referências

[1] http://pt.wikipedia.org/wiki/Transmutação
[2] http://pt.wikipedia.org/wiki/Galvanoplastia
[3] Zinc-plating copper and the formation of brass – 'turning copper into ‘silver’ and ‘gold’: Link
[4] Zinc plating of copper coin: Link.

domingo, 19 de outubro de 2008

PETN em baixa?


Desde a descoberta da nitroglicerina em 1846, os ésteres nitrados ficaram conhecidos por possuírem propriedades explosivas. Uma longa série desses ésteres foram subsequentemente utilizados como explosivos ou em combustíveis.

Um grupo de pesquisadores chefiados por David E. Chavez do Los Alamos National Laboratory (USA) desenvolveram um novo éster tetranitrado. O composto possui uma soma de características particularmente interessantes: é um potente alto-explosivo, é um sólido na temperatura ambiente, e pode ser derretido e moldado em formatos desejados. Veja abaixo a morfologia dos cristais do composto (escala em mm):

Ésteres nitrados contém uma enorme força explosiva. Porém, no estado líquido são difíceis de se manipular. Misturando vários outros componentes, Alfred Nobel desenvolveu a dinamite, um explosivo distintamente seguro baseado na nitroglicerina. Anteriormente, o único éster nitrado usado como explosivo foi o nitropenta (PETN - Tetranitrato de Pentaeritrina). Devido seu alto ponto de fusão (140°C), o PETN deve ser prensado para adquirir o formato desejado.

Então, Chavez e seus colegas de trabalho desenvolveram um éster nitrado que pode realmente superar e desbancar o mercado atual do PETN. Com seu ponto de fusão de apenas 85°C, que fica muito abaixo do seu ponto de decomposição (141°C), e pode ser derretido e colocado em moldes, o que industrialmente falando é uma vantagem sem precedentes frente ao método antigo de prensagem.

Esquema da síntese do explosivo (1)

O novo composto contém quatro grupos éster nitrado (-ONO2) e dois grupos nitro (-NO2), com um total de seis átomos de carbono. Seus cristais demonstraram uma alta densidade, o que não é comum nesses ésteres. Cálculos e simulações computacionais predizem que o novo éster tetranitrado possui um poder explosivo tão intenso quanto o HMX (9.1 km/s) - atualmente um dos mais potentes. A sensitividade do novo composto para choque mecânico, fricção, fagulhas e faíscas, é equivalente ao PETN.

Os pesquisadores também planejam usar sua nova rota sintética para desenvolver outros materiais explosivos.


Referências

[1] Synthesis of an Energetic Nitrate Ester. Angewandte Chemie International Edition 2008, 47, DOI: 10.1002/anie.200803648
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domingo, 12 de outubro de 2008

Transformar leite em água

Não... não é um artigo ensinando mais algumas manobras fraudulentas para a indústria do leite aqui do Brasil. Trata-se de química básica, mas interessante do ponto de vista didático. Um fluído muito parecido com leite, pode ser conseguido misturando água e hidróxido de cálcio; com a adição de ácido clorídrico a solução fica transparente: Jamais beba essas soluções, contém íons venenosos!

Ca(OH)2 + HCl -----> Ca2+ + 2Cl- + H2O

Outro método alternativo seria uma solução entre nitrato de prata e cloreto de sódio, clarificados com hidróxido de amônio (amoníaco, amônia aquosa).

AgNO3 + NaCl -----> AgCl + Na+ + NO3-
AgCl + 3NH3 -----> Ag(NH3)2+ + Cl-

Seja criativo, muitas reações criam precipitados brancos que permanecem em suspensão, e grande parte podem ser desfeitos com a adição de outros produtos químicos.
S.